COMO qualquer outro lugar do mundo, Cabanas não surgiu do "nada", tendo portanto uma história para contar, de que me vou ocupar em seguida.
Comecemos pela origem do nome, o topónimo "Cabanas" diz respeito a cabanas de pescadores, que consistiam em habitações artesanais, de habitação provisória, utilizadas sobretudo durante a época da faina, que eram utilizadas pelos pescadores para armazenarem as artes de pesca, para passarem a noite e descansarem antes do regresso para a labuta diária no mar. Obviamente, hoje em dia, já não resta nenhuma dessas antigas cabanas, mas supõe-se que durante o século XX ainda sobreviviam algumas.
Em 1732 é atribuída uma licença para a pesca do atum a uma companhia com sede em Tavira e que se denominava "Armação dos Mares de Tavira". Esta armação denominava-se, dois anos decorridos, "Armação de Tavira". No entanto, foi com o nome de "Armação do Medo das Cascas" com que ficou conhecida para a posterioridade. Supõe-se que as cabanas dos pescadores que participavam nesta companhia foram erigidas no local da actual aldeia.
Em 1747, é lavrada em Tavira uma escritura de venda de uns terrenos situados na Freguesia da Conceição que «confrontam pelo Nascente com a Canada do Concelho e pelo sul com a «Praia dasCabanas da Armação dos Atuns» (ob. cit.). É sem dúvida a primeira referência a umas cabanas num documento oficial, sob o nome de «Cabanas da Armação», topónimo por que a aldeia ficou conhecida até há cerca de 50 anos. Mais à frente, no mesmo documento, surge uma nova alusão, agora sob o termo «Cabanas da Barra», uma vez que durante esse século, a barra de Tavira situava-se aproximadamente a leste da actual localização da aldeia, não esquecendo que foi junto a esse local que foi erigida a fortaleza de modo a proteger a barra de incursões da pirataria moura. (1)
Supõe-se, assim, portanto que as cabanas dos pescadores tenham sido erigidas naquele local graças à situação estratégica que ofereciam: por um lado, com as embarcações da armação ancoradas em plena ria, protegidas das investidas do mar, ficavam mais seguras, e, por outro lado, na sua localização, permitiam que não fossem necessárias as deslocações até Tavira, que então, devido à mudança da barra, se situava já bastante longe. Por outro lado, do local onde se situava, partia um caminho conhecido por "Canada"(2) , que passa junto à Igreja da Conceição, que então já existia, com a estrada de Tavira a Cacela (esta estrada coincide mais ou menos com o actual percurso da EN 125), o que permitia a comunicação terrestre com a cidade.Como em todas os arraiais das armações do atum, estas cabanas não serviam de morada permanente aos pescadores durante todo o ano, mas apenas durante os meses da faina, de modo que eram abandonadas durante os resto do ano. Portanto, Cabanas ainda não era um sítio, nem uma povoação de pleno direito. Por definição, uma povoação só existe a partir do momento que os seus habitantes residam lá permanentemente. No entanto, tal não impediu que se registasse um nascimento, que de acordo com dados, ocorreu em 1757. Os pais da criança eram naturais da freguesia da Conceição e quanto aos avós masculinos, ao que se pôde apurar, um era da mesma freguesia e o outro era oriundo de Santa Luzia. Ora bem, ainda antes de ser uma aldeia perfeitamente estabelecida, houve lugar ao nascimento duma criança.
No ano seguinte, a Câmara de Tavira concede o primeiro aforamento de que se conhece a Cabanas da Armação. Em acta datada de 4 de Fevereiro de 1758, foi registado um "terreno de de varas em quadro a José Rui Estevens, pelo foro de sessenta réis em cada ano".
Isto signfica, pelo aforramento do terreno, que já havia habitantes a título permanente naquele local, o que é provado pela concessão dum terreno para a construção de habitação.
De 1763 a 1800 não existem infelizmente documentos que comprovem a concessão de mais aforamentos e só nos documentos camarários de 1827 se pode comprovar novamente a existência dos aforamentos então em exercício. Ao todo são dez e estão registados sob os nomes de Januário Viegas, Manuel de Brito, Manuel Martins, José de Lima, Custódio Viegas, Manuel da Horta, João de Lima, Jerónimo de Lima, Manuel Lourenço e José Lourenço.
Data de 1841 a primeira referência a Cabanas numa monografia regional. O historiador João Baptista da Silva Lopes na sua "Corografia, ou Memória Económica, Estatística e Topográfica do Reino do Algarve", na pág. 378, refere, numa secção referente a Conceição, os seguintes factos:
Em 1875 a Câmara levou a cabo a macadamização do caminho conhecido por canada, cortando a direito desde a Nora Branca até à ria. A obra ficou orçada em 2539,990 réis. A partir daí, os moradores deixaram de viver o incómodo de terem de caminhar por um caminho que, durante o inverno, se transformava num lamaçal, quando tinham de se deslocar até Conceição ou Tavira para a compra de víveres e outros bens.
Em 1890, com a constante migração de pescadores à procura de emprego nas armações do atum e outras, a povoação cresce, estando já edificadas 102 casas de alvenaria, apesar de ainda sobreviverem 12 cabanas de junco (dados provenientes do Inquérito Industrial de 1890 - colecção sobre Pescas).
Se Cabanas deve o seu nascimento à pesca do atum, foi no entanto com a actividade da pesca do polvo que teve lugar o salto decisivo para o crescimento da aldeia.
Dobrada a viragem do século, novos habitantes vêm residir na nova povoação, entre eles habitantes da vila da Murtosa, ao pé de Aveiro, entre eles o meu bisavô, Sebastião Viana, procurar ganhar vida nas constantes Campanhas de Pesca que então tinham lugar. É a Sebastião Viana que se deve o aparecimento da técnica do alcatruz para a pesca do polvo. Foi ele que reparou que os alcatruzes não utilizados que eram lançados ao mar apareciam muitas vezes com polvos quando eram recolhidos. A partir daí, envidou uma nova forma de pesca ao polvo, que lhe permitiu viver bem até cerca de 1940, quando a 2ª guerra lhe estragou o negócio.
Novo censo efectuado em 1911 revelava a existência de 144 habitações, nas quais residiam 540 pessoas, que são 837 já em 1940, para 224 fogos.
É também constituída a nova escola primária, cujas instalações se situavam inicialmente na rua principal de acesso à aldeia, mudando-se mais tarde para um novo edifício que foi terminada em finais dos anos 50.
Durante os anos 30 é efectuada uma colecta entre os habitantes, após o que é constituída a Sociedade Recreativa Cabanense, primeira associação cultural da terra, sendo depois construído a respectivo edifício, com um palco interior para os espectáculos e com um pátio para sessões ao ar livre. Em Setembro de 1961 Cabanas é posta em perigo pela nova barra do Cochicho, que abriu mesmo em frente à aldeia, o que obrigou a obras para a salvaguarda das habitações. É durante essas obras que é aberta a marginal na sua forma actual com a muralha e o paredão, de forma a resistir ao impacto das ondas. Dois anos mais tarde, chega a iluminação e o abastecimento eléctrico à aldeia. Nesse mesmo ano a Armação da Abóbora é destruída pelo mar, durante as tempestades de Inverno.
É em 1973 que é lançada a empreitada para a construção do primeiro empreendimento turístico em Cabanas, as Pedras da Rainha, projecto da empresa Atrium.
A seguir à Revolução dos Cravos, e aproveitando os programas de habitações promovidos pelos governos provisórios, tem lugar a construção de duas urbanizações sociais para albergar algumas famílias sem casa própria, assim como muitos retornadas das antigas colónias: os bairros Social e SAAL.
Entre outros melhoramentos nas infrastruturas básicas que tiveram lugar nos anos seguintes é de destacar a construção duma ETAR.
O censo geral da população de 1981 apontava para 1029 habitantes em Cabanas.
Durante os anos 80 seguintes assistiu-se a uma verdadeira febre de construção desenfreada, com muitas casas tradicionais algarvias da marginal e outros pontos a serem derrubadas para darem lugar a edifícios que nem sempre respeitavam as normas estabelecidas para o local.
Também por esta altura o comércio de férias começa a aparecer, com muitas bares, restaurantes e outros serviços a abrirem na avenida marginal.
Em 1985 é lançada a construção de outra unidade hoteleira, o Cabanas Golden Club, situado a oeste da aldeia, em terrenos situados para além do ponto da confluência da Ribeira da Conceição com a ria.
Um Centro Comercial é inaugurado em 1988, com muitas das lojas a abrir, mas funcionando principalmente de Verão.
Em 1997 e após sucessivas tentativas junto do Poder Central, é finalmente constituída a Freguesia de Cabanas, pelo decreto-lei 29/97, de 12 de Julho, sendo constituída uma Comissão Instaladora cujas funções eram, entre outras, proceder à procura de instalações para a sede na nova Junta e a preparação as eleições que tiveram lugar em Dezembro seguinte, eleições que acabaram com a vitória da Comissão Independente apoiada pelo PSD, UDP e independentes.
Em 1999 tem lugar a dragagem da ria em frente a Cabanas, já há muito reinvidicada pela população. Estas obras, da responsabilidade do Parque Natural da Ria Formosa, apesar de darem o fruto pretendido, acabaram por ter um saldo negativo, uma vez que a praia foi inquinada com lodos e pedras provenientes do leito da ria, para aonde foram lançados pela draga sem a mínima preocupação ambiental.
Nesse ano também tiveram início as obras para a construção da nova sede da Junta e o restauro do edifício da antiga Sociedade Recreativa. Um novo edifício que irá contar ao todo com três pisos, com divisões dedicadas às mais diversas actividades culturais e recreativas para ocupação do lazer.
Desde 1999 até agora (2005) teve lugar um grande crescimento urbanístico, multiplicaram-se as urbanizações, desde a Aldeia Formosa até ao aparecimento do primeiro hotel - que é na realidade, um resort - o Cabanas Park, com quatro estrelas. Entretanto, Cabanas foi elevada à categoria de vila a 12 de Julho de 2001, graças ao facto de ter ultrapassado o milhar de habitantes, facto constatado graças aos censos de 2001, que recenseou 1070 habitantes. Mais inaugurações terão lugar até ao fim deste Verão. Para mais, os resultados das eleições para a assembleia de freguesia em 2001 que tiveram como vencedor o PS, por escassa margem. Os resultados podem ser consultados aqui.
Passados quatro anos tiveram lugar novas eleições autárquicas, em que a lista de independentes, que tinha sido vencida no escrutínio anterior, recuperou o controle da autarquia. Resultados disponíveis aqui.
Anica, Arnaldo (1993) - Tavira e o seu Termo, ed. Câmara Municipal de Tavira.